‘’Não basta discutirmos sobre casamentos prematuros, temos de pôr as crianças a estudar’’

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Esta foi a ideia defendida pelas raparigas moçambicanas provenientes de todas as províncias do país, no âmbito da Conferência Nacional da Rapariga, que decorreu em Nampula, nos dias 14 e 15.  

O evento é organizado pela Fundação para o Desenvolvimento da Comunidade (FDC) em parceria com a Coligação para Eliminação dos Casamentos Prematuros (CECAP), com o apoio do FNUAP, da Embaixada da Suécia, da Coligação para Eliminação dos Casamentos Prematuros (CECAP), associações juvenis, grupos comunitários e clubes de escolas.

Sob o lema “Minha Educação, Minha Proteção: Eu Quero Decidir!”, as meninas analisaram diversos aspectos que as preocupam, com destaque para casamento prematuro, gravidez precoce, assédio nas escolas e ritos de iniciação.

Na ocasião, elas reconheceram o papel dos debates para mudança de comportamento, mas afirmaram que a maneira efectiva de acabar, por exemplo, com casamento prematuro e gravidez precoce deve ser a inclusão das raparigas na educação e a sua retenção.

Para o cumprimento deste objectivo, as raparigas pediram o aumento do número de escolas nas zonas rurais; definição de idade certa para os ritos de iniciação; contratacão de professores competentes; aprovação de leis punitivas, entre outros.

‘’Nós somos os futuros deste país. Nossos pais, às vezes, pensam que somos mercadoria. Na conferência, eu aprendi que não somos objectos. Posso decidir e dizer não, às vezes, mesmo se for para o meu pai’’, disse Samia Amad, uma rapariga de 13 anos e Presidente do Parlamento Infantil, no Distrito da Manhiça.

Segundo o Inquérito Demográfico e de Saúde (IDS) de 2011, 48{1a4e51e2a19926db2eaab1bcf154673d0b74297663ea632f824f7b556dd28b8e} das raparigas moçambicanas casa-se antes dos 18 anos e 14 por cento antes dos 15, sendo um dos países com as taxas mais altas do mundo (11º lugar) e na região da África Austral e Oriental (2º lugar).

Marisa Paula, de 16 anos, faz parte desta estatística do (IDS). Saiu de casa com apenas 13 anos para viver maritalmente com Pedro Augusto, desempregado e entre eles há 10 anos de diferença de idade. Marisa conta que no mesmo ano que saiu de casa teve um bebe e que tudo aconteceu com o consentimento dos país. “Meu pai disse que não tinha dinheiro para me manter em casa’’, disse, alertando a outras raparigas sobre a necessidade de tomarem liderança nos processos de decisão. “Minhas amigas, cuidem-se! Fala-vos uma criança, infelizmente, com experiência’’.

Segundo o UNICEF, as raparigas que completaram o ensino secundário têm 53{1a4e51e2a19926db2eaab1bcf154673d0b74297663ea632f824f7b556dd28b8e} menos probabilidade de estarem casadas antes dos 18 anos do que as raparigas que não tiverem acesso à educação. Outro aspecto é que há mais casamentos prematuros nas áreas rurais. Aqui, 56{1a4e51e2a19926db2eaab1bcf154673d0b74297663ea632f824f7b556dd28b8e} das mulheres entre 20-24 anos casaram antes dos 18, sendo que, nas zonas urbanas, a percentagem é de 36{1a4e51e2a19926db2eaab1bcf154673d0b74297663ea632f824f7b556dd28b8e}.

Ciente destes desafios, a Conferência Nacional da Rapariga juntou profissionais da saúde, representados por Igor Vaz, Cirurgião e Urologista, que falou sobre a fístula obstétrica e outras questões de saúde envolvendo raparigas; Clarisse Machanguana, promotora de comportamentos saudáveis em adolescentes e jovens, que falou sobre a prevenção do HIV, enfatizando iniciativas como SMS Biz/U-Report, que é um serviço de aconselhamento para adolescentes e jovens, através do qual os activistas respondem a centenas de mensagens de texto (SMS) com informações sobre diversos assuntos, como a prevenção do VIH/SIDA, saúde sexual e reprodutiva, casamentos prematuros ou violência contra a criança e adolescente.

“Temos de buscar informações certas nas pessoas certas. As amigas e os nossos pais podem ajudar, mas nem todos eles estão mais bem informados. Agora, já temos o SMS Biz. É só mandarem mensagens com dúvidas, para 92222’’, disse Clarisse.

Para a Directora Executiva da FDC, Zélia Menete, os esforços levados a cabo em prol das raparigas em Moçambique, quer pelo Governo, como pelas organizações da sociedade civil e parceiros de cooperação, precisam de ser intensificados.

Zélia pediu às raparigas, em particular às da província de Nampula, maior vigilância nos seus direitos e cumprimento dos seus deveres. “Nampula é uma das províncias com elevadas taxas de casamentos prematuros, por isso os esforços da FDC e de parceiros são redobrados. Queremos uma Nampula sem casamentos prematuros’’, anunciou.

O Governo aprovou, em 2015, a Estratégia Nacional de Prevenção e Combate aos Casamentos Prematuros, um instrumento importante para a protecção da criança, sobretudo da rapariga.

A sua implementação efectiva trará grandes avanços para a erradicação deste mal e, em certa medida, contribuirá para que progressos sejam dados neste sentido, não só em relação à eliminação dos casamentos prematuros como também na aposta de uma educação e saúde de qualidade para as raparigas moçambicanas.

A Conferência Nacional da Rapariga é anual e tem como objectivo principal reforçar o diálogo nacional sobre os direitos humanos das raparigas, como forma de construir alternativas mais eficazes que assegurem um ambiente propício em que as raparigas gozem de uma vida digna, sã e plena.